Tudo de Graça

Em novembro de 2008, os membros remanescentes do grupo humorístico inglês Monty Python postaram um aviso no Youtube, reclamando de que por três anos seus vídeos foram copiados e distribuídos ilegalmente pela rede. “Sabemos quem vocês são e onde vivem, e podemos nos vingar de formas tão horríveis que não podemos descrever, mas como somos uns sujeitos muito bacanas, encontramos uma forma melhor de acabar com tudo isso”. Assim, anunciavam a criação de um canal próprio no Youtube, com seus vídeos remasterizados e em alta definição, além de novidades como entrevistas, comentários e outras preciosidades para os fãs. A única coisa que pediam em troca de todo esse material gratuito era que os usuários continuassem a adquirir seus produtos originais, anunciados em links estrategicamente colocados junto aos vídeos, como uma forma de se redimirem dos erros que haviam cometido ao utilizar e distribuir as cópias ilegais. E a bem-humorada estratégia deu certo: No início de 2009 as vendas somadas de produtos do grupo atingiram o segundo lugar na categoria de Filmes e TV da Amazon.

Este caso é apenas um dos que ilustram o novo livro de Chris Anderson, editor chefe da revista Wired em seu novo livro “Free: The Future of a Radical Price” (No Brasil: ”O Futuro dos Preços Free”). Anderson, conhecido pela sua teoria da Cauda Longa (**), que fez muita gente repensar seus modelos de negócio a partir do ponto de vista das possibilidades de comércio na rede, agora ataca com uma teoria radical, porém plausível. O maior exemplo disso é o Google, que oferece serviços, softwares e informações, desde mapas até telefonemas comerciais – o badalado serviço Goog-411, sem custo algum para o usuário final, e fatura a bagatela de 5 bilhões de dólares por trimestre.

Dar alguma coisa para vender outra não é novidade, no início dos anos 1900, King Gillete distribuía seus barbeadores em centenas de promoções, para depois vender as laminas descartáveis. Na mesma época, a famosa gelatina americana Jell-O só se tornou um sucesso após uma estratégia de distribuição gratuita de mais de 15 milhões de livros de receitas de porta em porta. O mesmo se aplica a muitos negócios de hoje: ganhe o telefone celular, mas pague o serviço, compre impressoras baratas, mas pague cartuchos a peso de ouro …e por aí vai, exemplos não faltam.

O que muda do século passado para o nosso, segundo Anderson, é o surgimento de uma economia onde existem coisas realmente gratuitas, onde não há uma amarração visível entre um produto grátis e outro pago. A idéia é que zero também é um preço, e isso vira de ponta-cabeça alguns conceitos econômicos. Na medida em que a internet propicia a distribuição de alguns tipos de produtos e de muitos serviços com um custo próximo de zero, a equação tradicional de custos de produção e entrega não vale mais. Os custos fixos podem ser divididos quase que indefinidamente, levando o custo ao usuário final a um valor muito pequeno. Tão pequeno que fica atraente para outros negócios. Como assim? Embora matematicamente correta, a equação não funciona tão bem no mundo dos negócios tradicionais. Uma compra sempre envolve um complexo mecanismo de decisão do comprador, Chris Anderson afirma que a diferença entre vender alguma coisa muito barato, ou dá-la de graça é eliminar este processo de decisão. Isso quebra barreiras e facilita o acesso ao consumidor, que passa a ser um cliente da marca e mais facilmente aceitará pagar por produtos e serviços relacionado a ela.

E muitas empresas já adotam essas estratégias, por isso já podemos desfrutar de uma série de serviços pela internet sem pagar nada, e em breve teremos muito mais, com a lógica de facilitar o acesso do cliente ao produto e de forma indireta, facilitar a venda de outras coisas.
De qualquer forma alguém sempre paga a conta. Anderson classifica as possibilidades de negócio neste modelo em três grandes modelos:

Subsídio Cruzado: Quando se dá um produto ou serviço para vender outro produto ou serviço, como no caso dos telefones celulares, que já citamos.
Subsídio de dois lados: Quando uma classe de clientes subsidia a outra, como no caso de cartões de crédito sem anuidades que são subsidiados pelas taxas cobradas dos comerciantes, também clientes do banco.
“Freemium” ou “Grátis Premium”, quando alguns consumidores pagam e possibilitam que muitos usem de graça, como no caso de softwares que tem versões simples gratuitas e versões sofisticadas pagas.
Concluo com outra observação marcante de Anderson: “Tudo o que é software um dia será de graça”. Mais tempo ou menos tempo, surgirá um produto gratuito com funcionalidades similares aos que são vendidos hoje. O diferencial estará nos serviços. Em algumas áreas isto já é realidade: Só quem ganha dinheiro com software livre é quem empacota, implanta, ensina, mantém e suporta. As empresas e pessoas pagam para ter garantias, informações, facilidades e atendimento. Considerando tudo isso, não está na hora de repensar seu modelo de negócios para os próximos anos?

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